A I Jornada de Direito e Processo Penal, realizada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF), de 10 a 14 de agosto de 2020, aprovou 32 enunciados. Em razão da pandemia da Covid-19, o evento ocorreu por videoconferência e teve suas palestras transmitidas pelo canal do Conselho da Justiça Federal no YouTube.
Organizado pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, as jornadas têm por objetivo a produção de enunciados que cristalizam posições interpretativas sobre o ramo do direito ao qual se dedicam, adequando-as às inovações legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais por meio do debate entre especialistas.
Depois do debate e da votação nas Comissões, as propostas nelas aprovadas foram levadas à Plenária, na qual, após intensos debates e votação, entre 9h e 17h do dia 14/8/2020, foram aprovados 32 enunciados.
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Alguns dos entendimentos consolidados referem-se a inovações trazidas pela chamada “lei anticrime” (Lei 13.964/19), que alterou normas do Código Penal e do Código de Processo Penal.
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Enunciado 1: A norma puramente processual tem eficácia a partir da data de sua vigência, conservando-se os efeitos dos atos já praticados. Entende-se por norma puramente processual aquela que regulamente procedimento sem interferir na pretensão punitiva do Estado. A norma procedimental que modifica a pretensão punitiva do Estado deve ser considerada norma de direito material, que pode retroagir se for mais benéfica ao acusado.
Enunciado 2: Para a aplicação do artigo 40, inciso VI, da Lei n. 11.343/2006, é necessária a prova de que a criança ou adolescente atua ou é utilizada, de qualquer forma, para a prática do crime, ou figura como vítima, não sendo a mera presença da criança ou adolescente no contexto delitivo causa suficiente para a incidência da majorante.
Enunciado 3: A inexistência de confissão do investigado antes da formação da opinio delicti do Ministério Público não pode ser interpretada como desinteresse em entabular eventual acordo de não persecução penal.
Enunciado 4: A ausência de falta grave nos últimos 12 (doze) meses como requisito à obtenção do livramento condicional (art. 83, III, “b” do CP) aplica-se apenas às infrações penais praticadas a partir de 23/01/2020, quando entrou em vigor a Lei 13.964/2019.
Enunciado 5: É prescindível a decisão final sobre a prática de falta grave para obstar o livramento condicional com base no art. 83, III, “b” do CP.
Enunciado 6: É possível aditar a denúncia para requerer a perda de bens cujo conhecimento se der após iniciada a ação penal, caso em que, recebido o aditamento, deverão ser ouvidos os interessados e propiciada a dilação probatória.
Enunciado 7: Não fica caracterizado o crime do inciso IV do § 1º do artigo 33 da Lei 11.343/2006, incluído pela Lei Anticrime, quando o policial disfarçado provoca, induz, estimula ou incita alguém a vender ou a entregar drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à sua preparação (flagrante preparado), sob pena de violação do art. 17 do Código Penal e da Súmula 145 do Supremo Tribunal Federal.
Enunciado 8: Nos casos de Estelionato (art. 171, CP) cometido por meio virtual, a competência para processo e julgamento da ação será do local da agência bancária da conta depositária, se a vítima realizou depósito bancário em dinheiro, ou o local da agência bancária da vítima, se ela realizou transferência bancária (TED).
Enunciado 9: Para a decretação da Prisão Temporária é necessária a aplicação cumulativa do inc. III com o inc. I do artigo 1º da Lei n. 7.960/1989.
Enunciado 10: A decretação ou a manutenção da prisão preventiva, para a garantia da ordem pública, pode ser fundamentada com base no risco de reiteração delitiva do agente em crimes com gravidade concreta, justificada por meio da existência de processos criminais em andamento.
Enunciado 11: O pronunciamento jurisdicional do art. 396 do CPP, que recebe a denúncia, tem natureza jurídica de decisão interlocutória, portanto necessita de fundamentação, conforme art.93, IX, da CF.
Enunciado 12: O requisito previsto no art. 83, III, b, do Código Penal, consistente em o agente não ter cometido falta grave nos últimos 12 (doze) meses, poderá ser valorado, com base no caso concreto, para fins de concessão de livramento condicional quanto a fatos ocorridos antes da entrada em vigor da Lei 13.964/2019, sendo interpretado como comportamento insatisfatório durante a execução da pena.
Enunciado 13: O princípio da legalidade impõe que se observe, quando da soma das penas, o cálculo diferenciado para fins de progressão de regime.
Enunciado 14: Em caso de hipossuficiência, o não pagamento da fiança não pode ser motivo legítimo a impedir a concessão da liberdade provisória.
Enunciado 15: Para fins de aplicação do art. 91-A do Código Penal, cabe ao Ministério Público, e não à Defesa, a comprovação de incompatibilidade entre o patrimônio e os rendimentos lícitos do réu.
Enunciado 16: O rol trazido pelo artigo 50 da Lei de Execução Penal é taxativo, não comportando interpretação extensiva ou equiparação analógica.
Enunciado 17: Na observância dos pressupostos e requisitos à segregação cautelar, é incabível a decretação da prisão preventiva pelo crime de receptação exclusivamente em razão da suposta conduta ter ocorrido em área de fronteira.
Enunciado 18: Na execução penal, o não pagamento da multa pecuniária ou a ausência do seu parcelamento não impedem a progressão de regime, desde que os demais requisitos a tanto estejam preenchidos e que se demonstre a impossibilidade econômica de o apenado adimpli-la.
Enunciado 19: Cabe ao Tribunal no qual se encontra tramitando o feito em grau de recurso a reavaliação periódica da situação prisional do acusado, em atenção ao parágrafo único do art. 316 do CPP, mesmo que a ordem de prisão tenha sido decretada pelo Magistrado de primeiro grau.
Enunciado 20: É possível, em situações excepcionais, a aplicação da prisão domiciliar humanitária, prevista no art. 117 da Lei nº 7.210/1984, também aos condenados em cumprimento de regime fechado e semiaberto.
Enunciado 21: A decisão do Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) que avalia a falta disciplinar sujeita-se a posterior análise e decisão judicial, podendo ser novamente examinadas as questões de fato e de direito, bem como o magistrado proferir nova decisão, para reconhecimento ou não da referida falta.
Enunciado 22: As restrições previstas no § 16 do art. 4º da Lei n. 12.850/2013, com a redação dada pela Lei n. 13.964/2019, aplicam-se também aos processos penais para os quais a colaboração premiada foi trasladada como prova emprestada.
Enunciado 23: O crime de gestão temerária de instituição financeira exige a demonstração da violação das regras e parâmetros objetivos de gerenciamento de riscos e limites operacionais na administração, intermediação e aplicação de recursos de terceiros, instituídos pelas autoridades de regulação do sistema financeiro nacional.
Enunciado 24: Nos crimes submetidos à jurisdição brasileira, os provedores de conexão e de aplicações de internet que prestam serviços no Brasil devem fornecer o conteúdo de comunicações armazenadas em seu poder, não lhes sendo lícito, sob pena de sanções processuais, invocar legislação estrangeira para eximir-se do dever de cumprir a decisão judicial.
Enunciado 25: As obrigações pecuniárias (pena de multa, custas processuais e obrigação de reparar os danos) advindas da sentença penal condenatória recorrível, não podem ser executadas antes do trânsito em julgado.
Enunciado 26: A escusa absolutória do artigo 181, inciso II, do Código Penal abrange também a paternidade e filiação socioafetivas.
Enunciado 27: São imprescritíveis e insuscetíveis de anistia, graça ou indulto crimes que caracterizem graves violações de direitos humanos, praticados por agentes públicos ou particulares, diante da Convenção Americana de Direitos Humanos e da pacífica jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de observância obrigatória por todos os órgãos e poderes do Estado brasileiro.
Enunciado 28: Recomenda-se a realização de práticas restaurativas nos acordos de não persecução penal, observada a principiologia das Resoluções n. 225 do CNJ e 118/2014 do CNMP.
Enunciado 29: A responsabilidade a título de omissão imprópria deve observar a assunção fática e real de competências que fundamentam a posição de garantidor.
Enunciado 30: Excepcionalmente e de forma fundamentada, nos casos em que se faça inviável a realização presencial do ato, é possível a realização de audiência de custódia por sistema de videoconferência.
Enunciado 31: A decisão de revisão periódica da prisão preventiva deve analisar de modo motivado, ainda que sucinto, se as razões que a fundamentaram se mantêm e se não há excesso de prazo, sendo vedada a mera alusão genérica à não alteração do quadro fático.
Enunciado 32: A proposta de acordo de não persecução penal representa um poder-dever do Ministério Público, com exclusividade, desde que cumpridos os requisitos do art. 28-A do CPP, cuja recusa deve ser fundamentada, para propiciar o controle previsto no §14 do mesmo artigo.